Era sempre um dia muito especial e esperado
pelo ano todo. Um dia que iríamos ver a procissão marítima da Nossa Senhora dos
navegantes.
Era parte do ritual jogar moedas durante
a passagem da imagem da santa (moedas essas que posteriormente eram objetos de
um obstinado mergulho de resgate) e que era anunciada por um foguetório e sendo
conduzida por embarcações coloridamente ornadas com bandeirolas de papel de
seda, sendo, portanto, um sinal de reverência e promessa de bonança financeira.
O próprio trajeto até a área da
capitania era parte esfuziante do evento. Relacionado com a única saída
programada dos nossos pais sendo este uma rara ocasião, e assim seguíamos
juntamente com uma quantidade grande de pessoas da vizinhança até o local,
conduzidos por nossos avós reconhecidamente por nós como pais empoderados,
éramos então quatro netos como filhos considerados e assumidos.
Ele, o avô/pai com idade avançada com
seu chapéu feito de feltro andava meio aos trôpegos, mas definitivamente
resignado... quanto á ela, avó/mãe, lembro ser esta uma oportunidade
impar que se permitia tirar o inseparável avental das lidas do lar,
certificando-se sempre que as chaves da casa estavam em seu poder.
A casa, antes de sairmos era
precavidamente fechada, a energia elétrica desligada e minuciosamente assim
confirmada. E havia também um cão, chamado Tigre que com certeza deveria ser
este o seu dia mais feliz, pois estar solta de suas amarras era um fato único.
Mas para mim, havia ainda uma relação
com o local que implicitava fatos velados de minha origem paternal e, assim
sendo, me emprestava de alguma forma uma orgulhosa importância secreta.
A prainha de água morna e de onde não
deveríamos passar da altura da cintura estava impregnada de uma atmosfera
lúdica. De magia. De esperança. E até de uma felicidade inquietante como as
marolas que libertavam nossa algazarra e sorrisos.
Como se aquele dia feliz e esperado de
um 2 de fevereiro longínquo, fosse capaz de reverberar para sempre e pudesse
ser guardado nos recondidos da memória infantil para ser usado quando as forças
faltarem ou o rumo se perdesse num futuro de incertezas.
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